quinta-feira, 21 de agosto de 2014

ABERTURA DO SÍNODO DIOCESANO



HOMILIA da ABERTURA SÍNODO DIOCESANO  (14 de Agosto de 2014)


Caríssimos irmãos e irmãs:

O Senhor nos concede hoje uma grande graça: a abertura do SINODO Diocesano de Lwena. Será uma caminhada longa, feita de consultas em cada comunidade, assembleias paroquiais, eleições, sessões sinodais, publicação de conclusões, certamente mais de dois anos. Por isso dizemos que o Sínodo não é um evento, é um caminho.

O Sínodo é como fazer um bolo: a mulher (ou o homem) vai ajuntando os ingredientes, amassa, deixa repousar para que cresça sozinha sem lhe mexer, pois o fermanto, que leveda toda a massa, trabalha no silêncio; é como a acção do Espírito Santo, precisa deixar espaço, dar-lhe lugar, no silêncio, na contemplação. Depois de colocada na forma, a massa vai no forno, e depois de um tempo o bolo está pronto. Se a galinha não tivesse dado os ovos, se não colocássemos água, o bolo não sai; até aquele pouquinho de sal, contribui para o sabor final: todos somos importantes, mas atenção, ninguém se julgue indispensável, porque aqui o único indispensável é o Espírito Santo!

Como o bolo, o Sínodo cresce nos momentos de contemplação de silêncio, de escuta, para deixar-se guiar pelo Espírito. Quando a inteligência humana se desveste da sua arrogância e humildemente pede: Senhor, mostrai-me os vossos caminhos, e ensinai-me as vossas veredas. (Sal 24,4), então torna-se sábio.

Nossa terra oferece uma rica diversidade de produtos: água, fruta, peixe, mandioca, hortalizas, mas às vezes passamos fome; temos matas, pedra, areia, mafika, todos os elementos para construir casas, mas corremos o risco de dormir no capim. Não estou a falar que materialmente seja assim, mas refiro-me à vida espiritual, à vida da Igreja: O Sínodo convida-nos a sermos efectivamente igreja, não vivendo a fé de forma isolada, cada um no seu cantinho, mas como Corpo de Cristo, onde cada membro cumpre a sua função e não se percebe a si mesmo senão colocando ao serviço dos outros o tudo quanto é (1Cor.12,12), recebendo de Cristo a vida; o Sínodo nos convida a sentirmo-nos parte de uma construção bem ajustada onde a pedra angular é Cristo e o alicerce, os apóstolos. (Ef.2,20)

A comunidade católica deveria de tal forma dar um testemunho de unidade espiritual que por contágio positivo combatesse os grandes males da nossa sociedade: o egoísmo, a rivalidade, a inveja, a corrupção, que empatam as iniciativas de desenvolvimento e que mergulharam a província de Moxico numa verdadeira “emergência educativa.

O Sínodo nos move a uma conversão pessoal: Há pecados que nós cometemos por fraqueza; o coração sensível chora por eles e às vezes levam-no a uma conversão profunda: “seus numerosos pecados lhe foram perdoados, porque ela tem demonstrado muito amor. Mas ao que pouco se perdoa, pouco ama” Lc 7,47. Mas não é este o pior pecado: é mais grave deixar crescer rancores, raivas cuidadosamente regadas com pensamentos inúteis durante anos, antipatias, preconceitos por questões de língua, procedência, invejas... Ficai a saber que estes sentimentos, mesmo que enfeitados com análises minuciosas e argumentos aparentemente contundentes, vêm do maligno, de Satanás. A energia que dispensamos para cultivar com tanto esmero as inimizades e invejas, são energias que desviamos da tarefa essencial da evangelização. Talvez entenda-se melhor com um exemplo. Alguém diz: “Agora escolheram a/o fulana/o para dirigir o grupo, vamos ver o que ela é capaz de fazer...” Com essa frase apagou o nome, desencorajou os outros/as e o trabalho da fé cai. O Senhor vai pedir contas disso.

Há uma personagem que aparece muita vezes nos Salmos; é o “ímpio”: ele faz as orações que estão prescritas, mas pretende controlar tudo e vive na duplicidade, apresenta-se em público com arrogância e vaidade; no fundo age como se Deus não existisse. Deus se compadece de quem peca por fragilidade, mas não pode oferecer a sua graça ao coração duro e cruel.  “A iniqüidade fala ao ímpio no seu coração; não existe o temor a Deus ante os seus olhos, porque ele se gloria de que sua culpa não será descoberta nem detestada por ninguém. Suas palavras são más e enganosas; renunciou a proceder sabiamente e a fazer o bem. Em seu leito ele medita o crime, anda pelo mau caminho, não detesta o mal. Sal 35, 2-5

Mas a falsidade não vai longe: Vi o ímpio cheio de arrogância, a expandir-se com um cedro frondoso. Apenas passei e já não existia; procurei-o por toda a parte e nem traço dele encontrei. Sal 36, 35



O semeador de divisões, de polémicas inúteis, quem desencoraja aquele que tem boa fé, comete um pecado maior que outros a que damos a importância que não têm. A vida cristã é como um combate; a luta que travamos contra a acção de Satanás é real. São Paulo dizia: Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. 2 Tim4,7.   E o mesmo Paulo nos adverte que não é contra forças simplesmente humanas que lutamos: Porque não é contra os seres humanos que temos de lutar, mas... contra os espíritos do mal que estão nos céus (Ef 6,12) Satanás faz rusgas, procura infiltrados para realizar o seu trabalho; que estejam dentro, mas façam o jogo dele. A paixão de Deus é a salvação, quando alguém impede ou empata o trabalho que leva à salvação, está a fazer o serviço do inimigo da pessoa humana; por isso este pecado é particularmente grave.

 Atenção: ninguém se apoie nestas palavras para “detectar” demónios nos outros, não apontemos o dedo, apenas vigiemos para que no nosso coração não entrem esses sentimentos, não encontrem onde se agarrar, porque são como a musuwa (mulemba): cola-se a uma árvore, e suga-lhe a seiva, agarra-se a uma parede e faz cair o edifício. Não devemos vigiar apenas a língua ou as mãos para não agredir ninguém: devemos vigiar os nossos sentimentos e os nossos pensamentos. Iluminados por Deus, devemos colocar uma peneira nos nossos ouvidos, nos nossos olhos, na nossa mente, para estas coisas não aninhem em nós e, quando nos apercebemos que já entraram, não hesitemos em apanhar o machado e cortar essas árvores daninhas, arrancar as raízes e jogar fora as sementes. Não é assim que fazemos nas nossas lavras? O que fazemos para fora, para colher o que é necessário para nossa alimentação, façamo-lo também para dentro, para darmos o fruto espiritual desejado.

Este caminho de conversão pessoal e comunitário não passa apenas pelo estabelecimento de mecanismos de diálogo, não basta sentar-se à mesa das negociações e assinar tratados de paz; e muito mais profundo, é uma abertura à graça de Deus que nos une, deixar que Deus opere em nós uma transformação interior para que todos sejamos um, como o Pai e Cristo são um só. (cfr. Jo17,22).



O Sínodo é um tempo de Conversão pastoral; a Igreja existe para evangelizar, tu e eu fomos baptizados para evangelizar. A conversão de que falo não serve para fomentar a vaidade das virtudes, mas para acreditar, confiar, entregarmo-nos e Cristo e à tarefa da evangelização. Há seitas que, sob a aparência de rigor moral, de leis obsoletas, mas bem observadas, querem ganhar um ar de superioridade inclusive religiosa. São Paulo escreveu que “há muitos por aí, de quem repetidas vezes vos tenho falado e agora o digo chorando, que se portam como inimigos da cruz de Cristo, cujo destino é a perdição, cujo deus é o ventre,  (Filipenses 3,18-19), não porque comiam e bebiam até arrebentar; pelo contrário, porque orgulhavam-se dizendo: não como isto, não como aquilo, não bebo isto, não bebo aquilo; como se fossem santos e justos por praticar estas coisas. Para eles, a salvação não vinha de Cristo, mas do seu proceder aparentemente muito fino, cuidado, equilibrado, aumentando a sua vaidade e diminuindo a sua fé. Ninguém, pois, vos critique por causa de comida ou bebida, ou espécies de festas ou de luas novas ou de sábados. Tudo isto não é mais que sombra do que devia vir. A realidade é Cristo.” Col 2,16-17 Deveria repetir aqui esta frase cinco ou seis vezes, para que ninguém se deixe enganar. Por isso é necessário evangelizar, porque muitos pensam seguir Cristo e estão seguindo apenas a vaidade das suas obras: são inimigos da Cruz de Cristo e inimigos da alegria do evangelho.

O modelo da fé não é o cristão “tenho tudo” (tenho baptismo – comunhão – confirmação – casamento)... ter tudo isso está bem, mas basta. A conversão pastoral leva a assumir cada qual o dom que o Espírito Santo lhe deu para construir a unidade do corpo de Cristo, todo ele feito para evangelizar. Cada dom é diferente dos outros, mas não é autónomo porque é parte dum corpo, cuja cabeça é Cristo. Dali a diversidade de ministérios dentro da Igreja

 Para mostrar o verdadeiro rosto da igreja, que reza, celebra, ensina, atende os pobres, anuncia Cristo e isto em cada comunidade é preciso uma conversão! Há comunidades que são semelhantes a cinco empregados que lutam por sentar na única cadeira de plástico na loja das poltronas. Está tudo cheio de poltronas de diferentes tamanhos, cores e modelos, mas só estão a ver a única cadeira de plástico, a começar pelo chefe da loja! Seria tão diferente se percebêssemos as comunidades a todos os níveis não funcionando a ministério único, mas desde a rica diversidade ministerial com que o Espírito Santo orna a sua igreja!

É preciso uma conversão pessoal para compatibilizar os tempos para estudar, trabalhar, viver e conviver em família, assumir o compromisso na igreja, não apenas de vir na igreja, mas de exercer nela um serviço qualificado no anúncio, na oração, no exercício prático da caridade, superando uma vida espiritual que se parece a uma casa de apenas um quarto. Quando o cristão “um-quarto-só” era criança e adolescente, frequentava a catequese, jogava bola na igreja, vivia lá; quando ingressou no Primeiro ciclo, é estudante, talvez vai à missa aos domingos. Quando ganhou o primeiro emprego como guarda do estaleiro; ganhou novo estatuto, fala que foi da igreja. Poderíamos dizer, “simpatizante da Igreja”. E se ganhou um crédito, é empresário: comprou fato, gravata, pasta... e até um carro. E vai ao encontro de quem vai lhe dar alguma coisa talvez falsa para proteger o fato, o gravata, o carro e a conta bancária!

Faço um parêntesis a partir deste caso: a Bíblia fala sobre a feitiçaria e claramente diz que o feiticeiro não entra no Reino de Deus, como também quem pratica a adivinhação ou recorre a ela. Chama a atenção que hoje para nossa sociedade é normal o filho levantar a mão contra o pai, torturar à própria mãe até à morte, seguindo os veredictos inapeláveis dos seguidores do pai da mentira. Qual é o resultado prático? Acabam as famílias, os bairros e a própria cultura,
à qual se invocava para praticar estas coisas. Se nos é permitido eliminar o pai, a mãe, corta-se a raiz e com ela a pertença a uma família, a um povo, a uma cultura... para pensar. (fim de parêntese)

Uma casa bem organizada tem uma sala, um lugar onde dorme o dono da casa ou o casal, quarto das crianças (M e F), tem cozinha e WC... todos os ambientes são importantes e mantemo-los limpos, ordenados, arrumados. Porque não fazemos assim na nossa vida? Há tempo para tudo. E o cristão que adquire uma melhor formação e um status social mais elevado, longe de se envergonhar da sua fé, enriquece-a com novos conhecimentos, faz do seu emprego o local de apostolado e da sua família uma pequena igreja doméstica. Quantos casais lêm a Bíblia juntos uma vez por semana ao menos? Comece e a sua casa espiritual de um quarto só, vai ficar uma grande mansão! O que unifica o coração da pessoa humana é Cristo. Como se entende senão a sua palavra: “Vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados, que Eu vos aliviarei” Mt 11,28



O Espírito Santo habita em nossos corações para que cada um possa assumir a sua vocação. É comparável a uma sabotagem espiritual deixar de fazer uma coisa porque o outro também não faz: “Se aquele, que é o nosso superior faz assim, ele que deveria dar o exemplo, que fica então para nós?” Sabes o que fica? Trabalhar com mais afinco para suprir as deficiências do outro. Esta linguagem só se entende se olharmos para Cristo. Trabalhamos assim não é por razões humanas, mas para somar-nos ao grande projecto de Cristo, a salvação de todos e cada um, superando os defeitos alheios, as tentações pessoais, o cansaço. Para abrir-nos à missão precisamos curar a doença das irmãs kuhonga, as gêmeas: o pessimismo crônico e a passividade.

O pessimista crônico abre a boca só para dizer que não vai dar certo, vai concentrar-se num ponto secundário, ou terciário para não avançar, e quando se pede a sua colaboração, vai dizer que não tem formação, não sabe, não tem tempo, talvez pelo desencanto da vida cristã, pelos golpes da vida, ou pela insatisfação de si próprio. Aberto a Deus, poderá recuperar a juventude da alma, encontrar a Deus – Amor capaz de recriar o seu coração. Deverá recorrer à fonte de água viva. O pessimista é um desidratado espiritual. Sal 22, 2-3Conduz-me junto às águas refrescantes, restaura as forças de minha alma. 

A segunda gêmea é a passividade que, em alguns casos, chega a ser paralisia espiritual. É preciso renovar as metodologias de transmissão da fé. Tenho estado numa casa onde conservam toda a instalação eléctrica, os apliques, as tomadas, tudo limpinho, mas há muitos anos que não têm energia. A fé é energia, luz, vida, é isso que transmitimos, de uso diário, e não peças de museu que talvez vamos visitar uma vez na vida. Valia a pena comprar um gerador, mesmo que pequeno, para ter algo de luz. O católico auténtico sente na pele a urgência da evangelização; por isso recebe e transmite a energia que vem de Deus e se torna luz.



A Eucaristia e a Palavra divina são o alimento da caminhada sinodal. Participar de uma Eucaristia é um acto de amor, de união com Deus, uma paixão mais que uma obrigação. “Deixai uma paróquia vinte anos sem pároco e adorarão as bestas”, dizia S. João Maria Vianney, o cura d’Ars.

A Bíblia é o manancial, Cristo nos fala pelas Escrituras. Sinto imensa pena porque falta um pouco por toda a parte quem explique com amor o que muitos estão a ler sem entender.  Act 8,31 Como é que posso entender, se não há alguém que mo explique? Foi a primeira palavra frase de um africano no contacto com o arauto do evangelho, Filipe, quando estava a ler o livro do profeta Isaías. Sublime abertura do coração para a salvação! Um apelo que se repete com contornos dramáticos por causa do pulular de seitas não só no longínquo Luacano, mas também na periferia de Luena. Faltam braços, faltam línguas. Senhor, envia operários para a tua messe.

Cada cristão é um missionário pelo seu baptismo. A tarefa inalienável da evangelização é, ao mesmo tempo, fonte de superação do pecado, antídoto contra a superstição e prevenção da entrega do coração a poderes obscuros.

Que estes sentimentos nos movam a olhar para Cristo, amá-lo, segui-lo servi-lo anunciando o Evangelho de modo que Col 3,17 “Tudo quanto fizermos, por palavra ou por obra, seja feito em nome do Senhor Jesus, dando por Ele graças a Deus Pai.”

Na oração do Sínodo, ofereçamos ao Espírito Santo a nossa fragilidade, Ele que “tira força da fraqueza humana e faz da nossa fragilidade o testemunho da Sua grandeza” (Liturgia, Prefácio dos Mártires) ,torne fecundo o nosso Sínodo.

E que Nossa Senhora da Assunção, Nossa Padroeira, “já elevada à glória do Céu..., sinal de consolação e esperança para o povo peregrino” que somos nós, acompanhe esta Igreja de Lwena na sua caminhada sinodal.

ORAÇÃO PELO SÍNODO DIOCESANO DE LWENA

Espírito Santo

vem enriquecer com teus dons a nossa pobreza,

dá-nos o dom da Sabedoria

para descobrir a vontade do Pai

em nossa Igreja de Lwena que celebra o I Sínodo Diocesano,

para que vivamos num só coração e numa só alma,

numa comunhão dinâmica, aberta e missionária,

Que sejamos uma igreja fraterna, de portas abertas,

capaz de acolher a todos e enfrentar com audácia

os desafios da nova evangelização

Dá-nos a coragem de assumir a nossa vocação na igreja

vencendo as tentações do pessimismo e da passividade,

dedicando as nossas melhores energias

para levar para frente a nossa missão

com criatividade, paixão e ousadia,

para que tudo o que façamos em palavras e obras

seja feito em nome de Jesus.

Nossa Senhora da Assunção, nossa Padroeira

e Estrela da Evangelização

guie os nossos passos.

Amén



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